O Flamengo enfrentou uma semana desafiadora com dois empates sem gols consecutivos: primeiro no clássico carioca contra o Vasco da Gama pelo Campeonato Brasileiro, e posteriormente contra a LDU pela Libertadores, na altitude de Quito.
Os resultados, embora não sejam desastrosos, acenderam um alerta sobre a ineficiência ofensiva da equipe comandada por Filipe Luís, expondo um problema que tem se tornado crônico nesta temporada.
O clássico contra o Vasco: domínio sem eficácia
No Maracanã, o clássico entre Flamengo e Vasco terminou em 0 a 0, um placar que gerou reações diferentes entre as torcidas. Para os vascaínos, o empate soou como uma vitória moral, considerando o momento delicado que o clube atravessa. Já para a torcida rubro-negra, prevaleceu a frustração, especialmente após a goleada aplicada sobre o Juventude na rodada anterior do Brasileiro.
Os números ilustram bem o panorama da partida: o Flamengo finalizou 17 vezes, sendo 7 no alvo, mas não conseguiu balançar as redes. O goleiro Léo Jardim, em tarde inspirada, foi o grande destaque da partida com defesas importantes, inclusive um lance espetacular em cabeçada do atacante Pedro no segundo tempo, considerada por muitos como uma das grandes defesas do Brasileirão deste ano.
Como observado por especialistas que analisaram a partida, quando um goleiro realiza várias defesas em um mesmo jogo, isso geralmente indica que as finalizações, embora bem posicionadas, eram defensáveis. “Até a cabeçada do Pedro sensacional foi uma bola defensável, não por culpa do Pedro, pelo contrário, ele conseguiu cabeçar de forma espetacular e o Léo Jardim foi ainda melhor”, ressaltou um dos comentaristas presentes no Maracanã.
Faltou ao Flamengo aquele arremate perfeito, aquele chute indefensável que não dá chances ao goleiro adversário, por mais inspirado que esteja. Em outras palavras, o time criou volume de jogo, mas não conseguiu traduzir isso em qualidade real de finalizações.
Os protagonistas da ineficiência no clássico
A responsabilidade pelo desperdício das oportunidades não recai sobre um único jogador rubro-negro. Michael, frequentemente questionado pela torcida por suas tomadas de decisão, teve novamente uma atuação irregular. Em determinado momento do primeiro tempo, após driblar um adversário e encontrar-se em boa posição para finalizar, optou por tentar mais um drible, perdendo a chance de arremate.
Outro exemplo emblemático dessa indecisão foi protagonizado por Arrascaeta. Aos 44 minutos do segundo tempo, o meia uruguaio recebeu a bola dentro da área com espaço suficiente para finalizar, tendo um defensor a aproximadamente dois metros de distância. Em vez de arriscar o chute, preferiu girar e passar para Pedro, que estava cercado por três adversários, desperdiçando assim uma chance promissora de abrir o placar.
Gerson, meio-campista frequentemente elogiado pela imprensa e torcida, também tem sido alvo de questionamentos quanto à sua eficiência nas finalizações. No jogo contra o Vasco, o “Coringa” teve quatro oportunidades claras de arremate e não conseguiu converter nenhuma, inclusive desperdiçando uma chance no início da partida com um chute muito acima do gol.
A altitude de Quito e o jogo contra a LDU
Três dias após o empate no clássico, o Flamengo viajou ao Equador para enfrentar a LDU pela Libertadores. O confronto, disputado na altitude de 2.800 metros de Quito, representava um desafio adicional para a equipe carioca, embora não seja uma altitude tão extrema quanto outros estádios sul-americanos.
A importância do jogo era inegável: a LDU é tradicionalmente forte jogando em casa, tendo perdido apenas dois jogos em seu estádio no último ano – em maio e agosto de 2023. A equipe equatoriana sabe explorar muito bem seu principal aliado, a altitude, e montou uma estratégia eficiente para neutralizar as forças do Flamengo.
Durante os 90 minutos, o rubro-negro manteve a posse de bola e o controle territorial, seguindo o padrão que tem apresentado no Brasileirão. No entanto, assim como no clássico contra o Vasco, o time carioca não conseguiu transformar seu domínio em oportunidades claras de gol.
A LDU adotou uma postura pragmática: fechou-se defensivamente, cedeu a bola ao Flamengo e apostou nos contra-ataques, especialmente nos minutos finais, quando o cansaço provocado pela altitude começou a afetar os jogadores visitantes. A estratégia quase deu certo, já que os equatorianos tiveram duas chances claras de marcar, ambas de cabeça dentro da área – uma no primeiro tempo e outra nos minutos finais.
Problema crônico ou fase?
Analisando os últimos jogos do Flamengo, percebe-se que a dificuldade para balançar as redes não é exclusividade dos confrontos contra Vasco e LDU. Nas partidas recentes pelo Brasileirão e Libertadores, o time conseguiu marcar contra Deportivo Táchira (1 gol), Vitória (2 gols) e Grêmio (2 gols), mas teve problemas ofensivos contra Central Córdoba, Internacional e agora Vasco e LDU.
O padrão é evidente: o Flamengo domina territorialmente seus adversários, mantém a posse de bola e cria volume de jogo, mas tem dificuldade para transformar esse controle em gols. Mais preocupante ainda é que, mesmo quando não consegue marcar, a equipe acaba permitindo que o adversário crie oportunidades claras, colocando em risco todo o trabalho defensivo.
Essa ineficiência ofensiva levanta questões sobre o sistema tático implementado por Filipe Luís. Embora o treinador seja frequentemente elogiado pela imprensa e torcida, algumas escolhas têm sido questionadas, como o posicionamento de Gerson jogando mais aberto pela direita, quando seu melhor rendimento parece ser como segundo volante centralizado.
A posição de Gerson: dilema tático
Um ponto específico que tem gerado debate é a utilização de Gerson. O meio-campista, que recentemente foi convocado para a seleção brasileira, tem atuado mais pela direita sob o comando de Filipe Luís. Entretanto, muitos especialistas defendem que seu melhor rendimento seria como segundo volante centralizado.
No jogo contra a LDU, essa questão ficou ainda mais evidente. Com Gerson aberto pela direita, o time perdeu força no meio-campo e precisou fazer muitas transições rápidas, o que exigiu um esforço físico adicional do jogador em um ambiente já desafiador devido à altitude.
“O Gerson tem jogado de meia mais pela direita já há algum tempo, chegou na seleção e tal, tá bem, vive um grande momento. Ainda assim, para mim, o melhor Gerson é o segundo volante”, argumenta um analista. “O Gerson, com aquele tamanhão, ganhando bola de cabeça, brigando, protegendo com o corpo, saindo jogando com qualidade, se aproximando da área como um elemento surpresa centralizado… eu prefiro o Gerson no meio do que aberto na direita.”
No confronto em Quito, essa escolha tática pode ter contribuído para tornar o Flamengo mais previsível. Com Gerson aberto e tendo que fazer constantes transições, o time ficou limitado a explorar o lado esquerdo, facilitando o trabalho defensivo da LDU. No final da partida, o desgaste físico era visível, com Gerson completamente exausto devido às inúmeras transições que precisou fazer.
O retorno de Pedro: esperança rubro-negra
Um dos poucos pontos positivos para o Flamengo nesta semana foi a atuação de Pedro no clássico contra o Vasco. O centroavante, que retornou recentemente após sete meses afastado por conta de uma grave lesão no joelho, entrou no segundo tempo e, em poucos minutos, mostrou por que é tão importante para a equipe.
A cabeçada de Pedro foi um dos momentos mais eletrizantes da partida contra o Vasco, exigindo uma defesa espetacular de Léo Jardim. O lance demonstrou a qualidade do centroavante, que mesmo cercado por dois zagueiros, conseguiu finalizar com precisão.
A recuperação de Pedro em apenas sete meses, quando o normal para sua lesão seria um período de nove meses, é um exemplo de profissionalismo. O atacante montou um departamento médico em sua própria casa e abdicou de férias para focar integralmente na recuperação física, mostrando um comprometimento que contrasta com outros exemplos no futebol brasileiro.
Filipe Luís demonstrou reconhecer a importância do atacante ao afirmar que “o time vai jogar para ele” quando estiver plenamente recuperado. O treinador destacou que Pedro tem um perfil diferente de outros atacantes do elenco e que sua função é adaptar o estilo de jogo para explorar ao máximo as qualidades do centroavante.
Com a volta gradual de Pedro ao time titular, a expectativa é que as dificuldades ofensivas do Flamengo diminuam. O centroavante não apenas é um finalizador de primeira linha, mas também consegue fazer a ligação com os meias, participando da construção das jogadas.
A perspectiva cruz-maltina após o clássico
O Vasco, por sua vez, saiu do clássico com sensação de dever cumprido. A equipe cruz-maltina, que vive momento delicado na competição, conseguiu segurar o ímpeto ofensivo do rival, muito graças à atuação destacada de seu goleiro Léo Jardim.
O time comandado por Rafael Paiva teve suas chances ofensivas, principalmente no primeiro tempo. Uma finalização acertou a trave e o português Nuno Moreira desperdiçou uma oportunidade clara cara a cara com o goleiro Rossi. Fosse mais eficiente, o Vasco poderia ter surpreendido o favorito Flamengo.
No entanto, a análise tática do Vasco também revela preocupações. A equipe cruz-maltina deu muitos espaços defensivos, permitindo que o Flamengo criasse diversas oportunidades. Contra um adversário mais eficiente, esse sistema defensivo poroso poderia ter resultado em uma derrota.
Preços de ingressos: o debate econômico
Um aspecto paralelo que chamou atenção no clássico entre Flamengo e Vasco foi o preço médio dos ingressos: R$ 89,35. Com valores considerados elevados para a realidade econômica do torcedor brasileiro, o Maracanã recebeu menos de 40 mil pessoas para um dos clássicos mais tradicionais do futebol carioca.
A política de preços dos clubes tem sido alvo de críticas constantes. Na visão de muitos analistas, os dirigentes parecem ignorar a realidade financeira dos torcedores ao estabelecerem valores tão altos, como se estivessem operando em ligas europeias, onde o poder aquisitivo é significativamente maior.
Esse debate econômico é especialmente relevante em um momento onde os clubes brasileiros buscam aumentar suas receitas, mas correm o risco de afastar o torcedor dos estádios. Para o Flamengo, que possui a maior torcida do país, essa questão é ainda mais sensível, pois preços mais acessíveis poderiam significar estádios mais cheios e, consequentemente, uma pressão maior sobre os adversários.
Perspectivas e desafios futuros
Após os dois empates consecutivos, o Flamengo tem pela frente desafios importantes tanto no Campeonato Brasileiro quanto na Libertadores. Na competição continental, o time carioca ainda enfrentará a LDU no Maracanã, além de outros dois confrontos em casa, o que dá uma margem confortável para a classificação às oitavas de final.
No entanto, os problemas ofensivos identificados nos últimos jogos precisam ser solucionados rapidamente. Filipe Luís e sua comissão técnica têm como principal desafio encontrar o equilíbrio tático que permita ao time manter seu domínio territorial, mas com mais eficiência nas finalizações.
Algumas questões precisam ser respondidas: por que a última bola não está chegando tão redonda para finalização? Por que o time não arrisca mais chutes de média distância? Por que, mesmo dominando os jogos, o Flamengo permite que os adversários criem chances claras?
Essas são perguntas que Filipe Luís precisará responder com ajustes táticos nas próximas partidas. O potencial ofensivo do elenco é inegável, com jogadores de alto nível como Pedro, Arrascaeta, Gerson e outros. A expectativa é que, com o retorno pleno de Pedro e possíveis ajustes no sistema, o Flamengo volte a ser mais eficiente ofensivamente.
Conclusão: momento de ajustes, não de pânico
Os resultados recentes do Flamengo, embora não sejam ideais, não representam motivo para pânico. O empate fora de casa na altitude de Quito contra a LDU é considerado um resultado aceitável, especialmente considerando a força dos equatorianos em seus domínios. Já o empate no clássico contra o Vasco, embora frustrante, não compromete significativamente a campanha no Brasileiro.
O momento é de ajustes táticos e técnicos, não de mudanças drásticas. O trabalho de Filipe Luís tem mostrado aspectos positivos, como o volume de jogo e o controle territorial que o time mantém na maioria das partidas. No entanto, a eficiência nas finalizações precisa melhorar para que o Flamengo volte a vencer com mais frequência.
Os próximos jogos serão fundamentais para avaliar se os problemas identificados são uma fase passageira ou se indicam questões mais estruturais no sistema implementado pelo treinador. O potencial do elenco rubro-negro é inquestionável, restando agora encontrar a melhor forma de transformar esse potencial em resultados positivos dentro de campo.
